Amontoadas,
num canto esquecido do quarto, algumas dezenas de livros empoeirados. Tinham
aqueles que falavam de história, filosofia, outros falavam de amor, entre os
que escreveram grandes romances, havia as biografias de vidas gloriosas, de
glórias interrompidas, de heróis, uma viagem em grandes emoções que ocorreram
em outras décadas, outros séculos e atualmente. Era como sonhar acordado,
ficava encarando o espelho e vendo em si tantas personagens quanto pudesse
lembrar, criar.
Poderia
eu ser Pierrot? Tantas dores vivi, que até saberia quem seria Arlequim, e minha
amada Colombina. Talvez fosse eu Bentinho, a encarar aqueles olhos de cigana
oblíqua e dissimulada, aqueles olhos que eram como mar. Eu, sem medo que tive
de sentir, mergulhei, mas quanto mais fundo alcançava, mais a pressão parecia
comprimir meu peito, e eu entrava em meio às suas incógnitas, como se toda a
superfície desses olhos morosos fosse a armadilha para trancar esse meu coração
e depois me bastasse a sofreguidão.
Mas
foi essa linha tênue, que não sabe definir, uma situação um tanto delicada, em
que no momento que amava, sentia, como se precisasse sentir, doer. Necessitava
ter ali, em seus braços, a pessoa que fazia com que sentisse explodir luzidias
emoções, queria aquele calor de se apaixonar, ter em seu colo guardada parte de
seus sorrisos, de sua felicidade, ao mesmo tempo em que tinha ali suas dúvidas,
questões sem respostas, e a incompreensível vontade de sair, de estar só.
Mas
depois se via como um Pierrot apaixonado, imergindo em tristeza, mas a tristeza
que causou a si mesmo, de alguém que um dia teve e hoje é seu platônico, como
se o sofrer fosse aquilo que fazia com que se atraísse pela paixão. Tinha um
certo charme, invisível, porém sabia conquistar por seus curtos versos, por sua
boa fala, contudo o tempo mostrava que, ao contrário da sua conquista, não
poderia manter uma relação.
Amadurecia
mais a ideia que formava das pessoas do que os laços, era fácil observar à
distância. Eu olhava pra ela como se pudesse ver sua perfeição, transcendendo
toda a sua forma física que ali a minha frente se materializava, via o brilho
de seus olhos. Todos os brilhos que me conquistaram, eram meu engodo, depois
faiscavam em desprezo à minha condição de mártir. Perfurava como adaga,
rasgando a carne, cortando as vísceras, causando tremenda agonia.
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